O rapper brasileiro Rael tem dois álbuns e um EP, lançado recentemente, em sua carreira. Com os dias contados para terminar a digressão de “Ainda Bem que Segui as Batidas do Meu Coração” (2013), ele já tem marcada a data para iniciar a tour do EP “Diversoficando”, editado no fim de 2014. A repórter MAYRA RUSSO conversa via Skype com o cantor, músico e compositor, que fala sobre preconceito, a cultura hip hop e as novidades produzidas por ele.
Conhecido pela mistura de géneros musicais brasileiros e reggae com o rap, ele acaba por abranger um grande público através das suas canções. “Acho que essa mistura é um convite para outras pessoas e até as mais velhas também a começarem a ouvir rap”, revela Rael em entrevista. Embora essa não seja a receita principal para fazer com que o hip hop chegue ao topo das paradas, é uma maneira de dialogar com um público mais abrangente.
“Ser Feliz”, “O Hip Hop é Foda Parte 2”, “Hoje é Dia de Ver”, “Pré-Conceito” e “Envolvidão” são as faixas de “Diversoficando”, e foram todas disponibilizadas para download gratuito e pode encontrá-las também nos muros do Rio de Janeiro e de São Paulo. A malta conecta os fones em paredes com a logo do EP, e podem ouvi-lo de borla. Para Rael já não vale a pena lutar contra o download ilegal e gratuito, é preciso unir-se à essa ideia e fazê-la de maneira a chamar mais gente possível para ouvir as suas canções. “As pessoas que consomem já estão acostumadas ao artista disponibilizar de graça. E as pessoas que baixam isso de graça são as que vão no show, que também compram o físico às vezes”. O rapper acredita tanto nesse modo de distribuição que desistiu de assinar o seu último EP com uma gravadora justamente porque não queriam deixá-lo colocar para download gratuito.
Vindo da favela paulistana (o que ou quem é da cidade de São Paulo), as temáticas rondam assuntos que têm gerado furor entre os jovens que vivem na periferia, como o preconceito e a importância exagerada que tem-se dado aos bens materiais. “Esses dias eu fui numa festinha que teve na escola do meu filho e vi que eu era o único negro lá. Eu me senti incomodado, saca? Mas as pessoas estavam tranquilas. Eu vi que era uma ‘encanação’ minha. Devido a essa ‘chaga’ que fica de tanto você ter passado por situações de preconceito. Mas eu fico vendo que rola esse lance da classe mesmo”, responde ao ser perguntado se acredita que o preconceito no Brasil ainda é racial ou se é mais social. Emenda ainda que Os Racionais o ajudaram muito na afirmação da identidade e a andar de cabeça erguida. “Antigamente as pessoas falavam: ‘ah, entra água no seu cabelo?’. E eu não sabia o que dizer, não tinha resposta. Aí Os Racionais vieram com um discurso muito bacana que me deu autoestima e eu comecei a bater de frente com as pessoas e a não ligar muito para isso, para quem era muito idiota”, assume o brasileiro, que aprendeu com o rap a enfrentar o preconceito racial numa época que esse assunto era tabu até dentro de casa e nas escolas.
“Envolvidão” é a única faixa romântica e é também a mais comercial, sendo a que alcançou mais visualizações no YouTube. Mas Rael acredita que há uma divisão na sociedade. Existem pessoas que se importam com o que acontece na periferia e gostam mais de canções como “Pré-Conceito” e outras que pensam apenas na “possibilidade de agregar valor e dar uma expansão só para elas mesmas”. Por ter o tema principal o amor, muitas mulheres acabam se identificando mais com essa faixa do que com as outras quatro.
Sendo o hip hop uma cena que enfatiza a realidade e coloquialidade, o brasileiro revela a importância do género no seu crescimento pessoal e artístico. “O rap foi uma parada muito importante na minha vida em relação à questão racial, que hoje em dia eu sei lidar com isso. Não me afeta. Quem tem esse tipo de pensamento, de comportamento eu tenho pena na verdade. Acho que é uma ignorância tremenda. Os moleques da quebrada estão com uma autoestima maior agora.”
A preocupação maior do Rael é passar conselhos para os mais jovens, assim como acredita ter sido aconselhado através das músicas d’Os Racionais e do rapper paulistano Xis. “Acho que é uma responsabilidade que a gente tem, sim, de tentar abrir os olhos das pessoas, de fazer elas enxergarem que elas são maiores do que elas acham que são, que não é só porque você tem um sistema de ida e vinda, de ir trabalhar, pegar autocarro cheio e voltar, que a sua vida é só isso. Têm muitas outras coisas para se conquistar além do dinheiro, que são coisas pessoais, internas.” E completa com a visão que tem dos jovens hoje em dia. “A molecada está se perdendo muito. Eles não se acharam ainda como pessoa, como ‘o que eu vou ser? O que eu vou buscar?’. Não tem essa ambição saudável. Primeiro ele quer um ténis foda, uma mota foda. Eu acredito que a gente possa consumir. Eu quero ter coisas também. Mas essas coisas não podem falar por mim, não podem vir primeiro e nem serem o ponto vital da minha vida. Então eu tento pregar isso para a molecada.”
Durante a conversa (para ler a entrevista completa, clique aqui), Rael admite ter vontade de trazer a digressão de “Diversoficando” para a Europa e anuncia o dia 12 de Março para o início da mesma em São Paulo, no Brasil.